O João Lisboa, o Paulo Furtado, o rock e o fado
João Lisboa desancou nesta semana que passou, no seu Expresso, alguns dos álbuns nacionais recentes mais valorizados pela maioria da crítica: falo de "Masquerade", de Legendary Tiger Man; de "Cruisin' Alaska", de Weatherman; e de "Isto É O Quê, Mãe?", de Erro aka João Palma.As razões que o jornalista aponta são as do costume: a música destes artistas segue os moldes dos formatos musicais anglo-saxónicos, do rock ao pop, passando por todo aquele território extenso que fica entre estes dois pólos. Diz ele (por outras palavras) que o blues do Tigerman, por exemplo, é um som formatadamente norte-americano, que não reflecte um som tipicamente tradicional português, como os Clã ou os Mão Morta.
Mas agora pergunto eu: porque raio têm todos os portugueses de procurar uma música que espelhe a tradição portuguesa? Será que têm todos de cantar fado, de cantar a saudade e a triste sina nacional? Ou têm todos de tentar revolucionar a música portuguesa? É que eu saiba, António Variações só houve um, e casos destes de sucesso aparecem muito pouco...
Se o Paulo Furtado gosta de blues e de rockabilly, porque raio haveria ele de tocar outra coisa? Sempre ouvi dizer que quem toca é por amor à música. E todos aqueles que se comprometem musicalmente aos gostos do público são automaticamente apelidados de "vendidos". Então porque não pode o Paulo Furtado tocar blues? Porque teve a infeliz sorte de nascer no lado errado do Atlântico? Estarão então todos os músicos nacionais dependentes do acaso?
"Ah e tal, mas ele canta em inglês e é português , yada yada yada". Se ele tocasse o blues dele em português, deixava de ser blues. É que o blues (ou o rock'n'roll), faz tanto sentido ser cantado em português como o fado em russo. Lembro-me de há uns tempos ter aparecido nas notícias uma japonesa que cantava fado. Claro que a maioria do povo português disse logo que aquilo não era fado, que era contra-natura e que ela, ao menos, devia cantar em japonês. Mas se ela cantasse fado em japonês, aquilo não era fado...
Por estas e por outra é que depois surgem normas de estado e leis tão geniais como a actual Lei da Rádio. Sejamos simples: quem quer ouve, quem não quer não ouve. E se o jornalista João Lisboa quer escrever um artigo sobre o novo disco do Tiger Man diga que não gosta porque não acrescenta nada ao blues; mas não venha dizer que é por ser um português a cantar em inglês.